Conquista,Política,Sociedade IGUALDADE RACIAL APOIA PRIMEIRO SEMINÁRIO DE INDÍGENAS E QUILOMBOLAS DA UESB

IGUALDADE RACIAL APOIA PRIMEIRO SEMINÁRIO DE INDÍGENAS E QUILOMBOLAS DA UESB

Flávio Passos

Abrindo a programação do Mês da Consciência Negra de Vitória da Conquista, dia 3, na UESB, aconteceu o I Seminário com o título “A Presença Indígena e Quilombola no Ensino Superior da Bahia”. Promovido por uma comissão de estudantes indígenas e quilombolas, o evento contou também com a assessoria da Coordenação de Igualdade Racial da Prefeitura de Conquista e o apoio da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) da Universidade do Sudoeste da Bahia e da Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade Racial (SEPROMI).

Após 10 anos de implantação do sistema de cotas em universidades públicas da Bahia, a presença de centenas de indígenas e quilombolas já se faz significativa, seja em termos numéricos, seja em termos das demandas que apontam para os desafios da permanência e do êxito dos universitários cotistas. Das mais de 400 vagas adicionais destinadas anualmente para os dois segmentos em sete das instituições da Bahia (UESB, UESC, UFES, UFBA, UNEB e UFRB), menos de30% são preenchidas.

Desde julho, foram mais de doze reuniões preparatórias para o Seminário da UESB, mobilizando mais de quinze jovens quilombolas e indígenas na comissão organizadora, além da colaboração de universitários do Coletivo Amplo de Estudantes Negros, Negras, Indígenas e Quilombolas da UESB. O evento da UESB foi o primeiro de quatro seminários preparatórios para o I Encontro de Estudantes Indígenas e Quilombolas do Ensino Superior da Bahia, previsto para maio de 2014, em Feira de Santana. Os próximos seminários serão em Salvador, dia 14, no auditório do Campus I da UNEB, e em Feira de Santana, dia 21, na UEFS. O da UESC ainda está em construção.

Dentre os principais objetivos dos seminários e do I Encontro destacam-se a mobilização dos segmentos dentro das universidades públicas, o debate sobre as demandas envolvendo políticas de cotas e acesso, de permanência e êxito, além do despertar para temáticas relacionadas à identidade e ancestralidade e a organização quilombola e indígena no espaço acadêmico.

O seminário contou com a presença de professores da UESB e da UFBA, com lideranças e estudantes de mais de 26 comunidades quilombolas do território de Conquista e de Jequié, de onde vieram 20 estudantes do quilombo urbano de Barro Preto. Oito cotistas da Estadual de Feira de Santana também marcaram presença no seminário.

Na mesa de abertura, a UESB tornou pública a adesão da instituição à Rede Estadual de Combate ao Racismo e Intolerância Religiosa, tendo a presença de representantes da Reitoria, das Pró-Reitorias de Graduação e de Extensão e a professora Josilene Costa, representante da UESB na Rede. Representando a Prefeitura de Conquista, o Presidente do Conselho de Igualdade Racial do Município, Uelber Barbosa. E o Pré-Vestibular Quilombola, o assessor técnico Flávio Passos e a presidente do Conselho Quilombola, Robélia Alves.

A Conferência de abertura, com o tema: “O combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa” foi proferida pelos professores Benedito Eugênio, Coordenador do ODEERE (Órgão de Educação para as Relações Étnico-Raciais, com sede na UESB de Jequié) e Vilma Reis, militante negra e Vice-Coordenadora do Conselho Estadual de Desenvolvimento da Comunidade Negra (CDCN), na ocasião representando também a SEPROMI e a Rede. A mesa redonda com o título do seminário contou ainda com a presença da professora Raquel Souzas, docente da UFBA de Conquista, de Ângelo de Oliveira, indígena Kaimbé e discente de Filosofia na UEFS, e de Jamile Santos, quilombola da comunidade de Barrocas e concluinte do curso de Geografia na UESB de Conquista.

À tarde, os participantes estiveram nos Grupos de Trabalho debatendo dezenas de desafios que indígenas e quilombolas enfrentam no ensino superior. Dentre eles, o aprimoramento dos cursinhos pré-vestibulares voltados para indígenas e quilombolas; a revisão dos critérios de acesso através das cotas adicionais, para que efetivamente promovam inclusão (a UFBA, a partir de 2014, passou a adotar um edital específico para o ingresso de quilombolas e indígenas); a criação de bolsas de permanência que garantam condições para um bom desempenho acadêmico dos cotistas (o MEC possui um programa de bolsas no valor de R$900,00 reais para indígenas e quilombolas estudantes de instituições públicas e que até agora tem sido acessado apenas por instituições federais, como a UFBA); a superação do racismo institucional; a implementação da Lei 10.639/03 no currículo universitário das universidades estaduais da Bahia; e o fortalecimento das organizações quilombolas, dentro e fora da universidade.

Três acontecimentos de 2014 são emblemáticos da necessidade de um amadurecimento das políticas de cotas no ensino superior na Bahia e no Brasil. No início do ano, uma ação conjunta entre o Conselho Quilombola, a UESB e o Pré-Vestibular Quilombola, conseguiu recuperar uma vaga do curso de Direito que estava ocupada por um não quilombola que havia fraudado a documentação para ingressar como quilombola. Tem aumentado os relatos de casos racismo contra cotistas pobres e negros, muitas vezes através de falas de professores, mas também por ações violentas de colegas de curso. O curso de Odontologia, no campus de Jequié, com três jovens alunos quilombolas oriundos do território de Conquista, continua cobrando, a partir do terceiro semestre, que todos os alunos providenciem itens como aparelhos cirúrgicos cujos valores variam de 3 a 5 mil reais por semestre. Uma contradição, considerando que a bolsa permanência da instituição é de R$260,00 reais mensais, quando o aluno consegue passar pela seleção, cujos critérios continuam os mesmos de antes das cotas.

Na plenária final do seminário, conduzida pela comissão estadual de organização do I Encontro Estadual, foram aprovadas dezesseis propostas que serão sistematizadas e apresentadas, em audiência, à Reitoria da UESB. A PROEX e a PROGRAD já se pré-dispuseram ao diálogo. Há um consenso no sentido de se construir uma política de ação afirmativa que, além de reconhecer, através das cotas, a histórica ausência de indígenas e quilombolas no ensino superior, também promova políticas de permanência que garantam, a indígenas e quilombolas, uma trajetória acadêmica que faça a diferença na vida dos estudantes e das suas comunidades. “Este será o primeiro de muitos seminários que faremos, pois chegou a hora da nossa presença na universidade ser reconhecida”, concluiu a coordenadora da Comissão do I Encontro, Roselene Germano Santos, estudante de Ciências Biológicas na UEFS e quilombola da comunidade de Lagoa de Melquíades, um dos 32 quilombos reconhecidos pela Fundação Palmares em Vitória da Conquista.

Para concluir o dia que ficou com sabor de “quero mais”, o Samba de Roda “Negras do Beco”, da comunidade tradicional negra do “Povo de Dôla”, do Bairro das Pedrinhas, promoveu uma linda roda com os participantes.

Flávio Passos, 43 anos, militante negro da Rede Educafro, assessor técnico na Coordenação de Igualdade da Prefeitura de Vitória da Conquista e coordenador do Pré-Vestibular Quilombola e do Núcleo Medicina Conquista.

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